"e sempre, e tanto.."

quinta-feira, 15 de julho de 2004

Hoje - Thayse Madella

Hoje, é só mais um dia, apenas um advérbio de tempo, nada além disso. Então qual a sua relevância? Por que todos esses sentimentos? Meu dia começa as sete, é sempre assim. Mas hoje foi diferente. Um café amargo e uma torrada, estou atrasada. Pouco importa, afinal, é hoje. Nada está certo, mas ninguém acha o erro. Ainda é cedo, mas estou atrasada. A cama desarrumada, o pijama no chão do quarto, não tenho tempo, organizo quando voltar.
A rua ainda deserta, o carro na garagem, leio o jornal mais tarde. As árvores à frente balançam com o vento da madrugada fria. Um turbilhão de pensamentos invade minha mente. Ainda não sei o que fazer. Até ontem, esperava por esse dia como se fosse o mais importante de toda a minha existência, no entanto, agora, queria não estar vivendo esse momento. A lembrança do passado, agora no presente momento, todas as alegrias, mas também o final sofrido. Final!? Não foi um final, talvez agora termine. Não deve acabar assim, depois de tanto tempo. Pode não ser um fim, pode ser um começo, ou melhor, recomeço.
Preciso me acalmar, tenho que dirigir. Liguei o carro, mas não consigo tirá-lo da garagem. Preciso me acalmar. Minhas mãos tremem, todo o meu corpo treme. Um sonho, uma realidade, talvez ainda, apenas um sonho. A distância por tanto tempo esteve entre nós, agora tão perto, parece maior. Preciso me acalmar. O caminho é curto, ao mesmo tempo interminável. A estrada ainda solitária. A lembrança dele em minha mente. E se ele mudou? Ou se eu mudei? Talvez não sejamos os mesmos. Cinco anos é muito tempo. Não vejo nada na minha frente, nem meu futuro.
Tínhamos só dezesseis anos. Éramos jovens. Esses pensamentos em minha mente. Meu coração pulsa forte. Estou suando. Está frio. Ainda sinto o calor de seus lábios. E a neblina cada vez mais alta. Dirijo com toda a velocidade que posso. Preciso vê-lo novamente. Um ano juntos. Separação. O medo invade meu corpo. Apenas um telefonema, apenas por trinta segundos escutei sua voz. E hoje, o reencontro tão desejado. Suas fotos nunca saíram do porta-retrato. Seu rosto nunca saiu da minha cabeça. Essas imagens me perseguem.
O baile, a praia, o cinema, cada momento passa como se fosse o filme do nosso amor. Como se fossem os únicos momentos de felicidade que já tive. Ele nunca me escreveu. A mudança de sua família mudou também minha vida. Agora dirijo em direção ao meu futuro. Se eu possuir um. Minhas mãos estão geladas. Preciso me acalmar. A neblina aumenta. Meu coração acelera cada vez mais.
Algo está errado. Nada vejo. Apenas um barulho. Mal consigo fazer a curva. Não! Um caminhão em minha direção. Não consigo desviar. Preciso chegar ao aeroporto. Ele me espera. Um som ensurdecedor. Logo após, vidros quebrados. Sirenes. Pessoas estão em torno do carro, olhando, assustados. A escuridão.
Naquele dia o quarto não foi arrumado, o jornal não foi lido e ele... Ele a esperou.

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